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dharmakarma

25/02/2020 - PM:12:20

Lago Azul,

Boa Vista - Roraima.

#Performance

A performance Dhramakarma é uma integração “ritualística/meditativa”  com a natureza. Por meio da meditação, vou buscar na minha consciência uma atmosfera de conexão entre o dharma (lei cósmica) e o karma(causa e efeito). 

 

Harmonizar-se com as leis naturais da consciência criadora, é vivenciar o dharma.

                 Se você seguir o dharma, terá um bom karma - Upanishads


 

Relato da performance 

  

Assim que cheguei ao local - Lago Azul, Boa Vista - Roraima - deparei-me com  a complexidade da natureza. O primeiro elemento a se apresentar foi o fogo. O calor era intenso, a força do Sol era magnética e ao olhá-lo, pude ver uma borda de luz azul ao seu redor. Eram 35ºC de pura energia solar. 

Ao olhar esse Grande Astro de forma contemplativa, eu o reverenciei. Naquele instante, conectei-me com a força do Deus Rá (Deus egípcio do Sol). Mentalizei seus raios entrando pelo meu corpo. Em minha mente aparecia uma incandescente bola de fogo. Agradeci a fonte solar por compartilhar a sua mais pura energia de amor e de vitalidade.

O próximo elemento contemplado foi a água. Ao observar seu movimento, tentei expressar o mesmo ritmo dentro do meu ser, reverenciando o seu balanço. Quando ocorreu tal conexão de forma espontânea, comecei a realizar movimentos livres e aleatórios com meus braços, criando mudras de conexão com o espaço ao meu redor. Cada movimento traçado pelo compasso transmutador (meu corpo) gerou  um campo energético, alguns movimentos do yoga foram convocados pela minha intuição. 

Aguçada pela natureza e seus encantos - textura da grama, cor do céu e das águas, som do vento, gosto da brisa, juntamente ao odor da umidade, fui conduzida a um ato livre de conexão com meu karma, na tentativa de transcrever meu próprio universo sensorial.

Nesse ciclo performático, tentei fundir-me em unidade com a consciência cósmica, dando início ao meu processo artístico. Criou-se, então, uma vibração, um momento presente. Uma primeira epifania foi gerada com o terceiro elemento (a terra) ao apresentar-me ao solo. Numa relação intrínseca entre a terra e meus campos energéticos, os chakras foram ativados num rito de batismo. Em pleno êxtase, meu corpo dança com a ajuda de um tecido e  adquire uma nova consciência  e torna-se meu guia de contratempo, ritmo e balanço. O compasso transmutador (meu corpo) unifica-se com o espaço, em plena exaltação e entrega à magia da natureza em toda sua plenitude cósmica. Mas, abruptamente, tudo se acalma: a forte brisa de vento já não mais sacudia minha alma, um insight acontece, exige-se um momento de calmaria e meditação. A mente vai ao encontro de um novo desafio, levando-me à reflexão acerca da dor. Num ato de enfrentamento, ergo os braço e sinto a dor por alguns instantes. Ela (a dor) atordoa minha mente, queimando e causando sofrimento em meu corpo. Um estado de desespero começa a surgir. Mas, minha mente está desperta, e de forma intuitiva, percorre até a raiz da dor. Quando chego até ela me apresento, e ela se retrai. Revela-se aí a capacidade de perceber o quão  complexa é a dor. Sofro de uma dor crônica no braço direito há 5 anos (bursite).Naquele momento, sinto a força do vento. 

Apresenta-se o quarto elemento, o ar. Era como se esse último envolvesse meus braços.  A dor aos poucos  foi se dissolvendo e, no meu campo mental, surgia imagens de grandes Sadhus, místico ou monge hinduísta  da Índia. Num ato de resistência e fé, me integrava com uma pequena partícula energética de um Sadhu. Por mais de 43 minutos, mantive meus braços elevados,  em movimentos para estimular minha força. Parei de sentir meus braços queimarem, ou seja, alí já não havia mais dor. Era como se meus braços já não existissem naquele espaço-tempo. Porém, quando a felicidade se apresentou ao meu estado de espírito, ocupou o lugar da concentração. Por um milésimo de segundos saí da meditação e do agora. Vi-me envaidecida pela “conquista”. No mesmo milésimo, o tecido escapa de uma das mãos, não pela dor  provocada pelo movimento, mas sim pela mente, num ato de distração. Isso foi o necessário para o encerramento espontâneo da performance.  

Num fechamento ritualístico,  sou chamada pelas águas para selar a experiência. Agradeço e me entrego às águas. Entro na lagoa de costas num ato de total confiança e pertencimento. Caminhando até me submergir nas águas. Uma vez embaixo d'água,  um novo mundo é novamente revelado. Naqueles ínfimos segundos de mergulho, vivencio o tempo exato para uma nova experiência. Sinto o acolhimento de Oxum (Deusa do amor, Orixá das águas doces, aquela que mantém em equilíbrio as emoções da fecundidade e da natureza). Percebo ,energeticamente seu afago, seu colo e, com seu suave toque, ela me ergue de maneira serena. A rainha das águas, me devolve para o tempo real, ao meu estado normal de consciência. E quando dou meu primeiro respiro fora d'água, mesmo tendo a sensação que eu podia respirar submersa,  abro os olhos e, no mesmo instante, retorno àquele lugar, à lagoa Azul de Roraima. 

 

Alguns minutos depois, já estava revivendo meus conflitos internos e medos. Retorno ao estado que estão dispostos meus karmas. Começo a observar ao meu redor: vejo crianças brincando na água, famílias unidas em prosa. Pude então perceber, a felicidade,e lembrei-me da ruptura antes vivenciada com  a perda do lenço. 

Naquele instante, pensei,  na ganância de alguns poucos homens que não prezam pela preservação da natureza. Como deixamos tais homens nos ludibriar? Afinal,  esses homens somos nós mesmos, apenas manifestando um pouco mais da cobiça que habita em nosso ser. 

 

O que precisamos refletir é: se continuarmos a tratar a natureza com tanto descaso, a lagoa Azul poderá sumir, podendo até secar.De modo que aquelas pessoas reunidas ali, não existirão mais. A energia criada pela existência destas almas, não terão mais aquele espaço para viver inconscientemente o sagrado. Esse ambiente deixará  de emitir a troca mais precisa que existe: a relação harmônica do homem com a natureza. Cada vez mais, lugares assim estão sendo destruídos e varridos pela poluição atmosférica.

 

Deixamos de nos deparar com o nosso ser interno, não questionamos as atitudes externas, que poucos homens cheios de ambição, geram sofrimento e vem devastando Gaia (estado de consciência materna do planeta).


 

Quando passamos a entender a força interna que habita nosso ser, podemos vivenciar a magia da ancestralidade de nossa alma.

Ao meu ver artístico/poético/espiritual  a alma é energia, é luz, viaja fora do tempo da nossa consciência. É atemporal e mesmo assim está dentro de nosso corpo. Nossa alma é a comunicação direta com o sagrado. A alma é capaz de ir além da arte pela estética.

Ela revive o sagrado, é a  inspiração no mítico, é a busca de reconexão do esotérico e é a  exaltação no ritualístico. A alma é UNO. 

Como diz, Ernst Fischer : “Nos alvores da humanidade,  a arte pouco tinha haver com a “beleza” e nada com contemplação estética, com desfrute estético: era um instrumento mágico, uma arma da coletividade humana em busca da sua sobrevivência”. 

 

E nós estamos agora, revivendo a busca de nossa própria existência/sobrevivência. 

“A aridez da terra causada pela mão humana cria desertos de solidão em nossa alma”. 

GABRIELA MAMODISI© 2020

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